CHICO BUARQUE E SEUS 77 ANOS
Nossa música, uma das mais diversas e respeitadas no mundo, possui os maiores compositores de todos os tempos. Entre eles, Noel Rosa, Cartola, Lupicínio Rodrigues, Vinícius de Moraes, Ary Barroso e, claro, Chico Buarque de Holanda, o aniversariante do dia, que completa 77 anos de idade, em plena forma.
A obra do poeta de olhos azuis, filho do historiador Sérgio Buarque e da pianista Maria Amélia Cesário - que também foram pais das cantoras Miúcha, Ana de Hollanda e Silvia Buarque - é uma das mais importantes da história da MPB. Dos festivais dos anos 60 (quando estreou com “A Banda”) ao mais recente álbum, “Caravanas”, lançado pela Biscoito Fino em 2017, destacam-se obras-primas que ajudaram a forjar a nossa identidade musical, sempre com letras e melodias expressivas, sejam criações solo ou em parcerias com Francis Hime, Edu Lobo, Tom Jobim e outros amigos.
Algo que impressiona os ouvintes mais atenciosos e analíticos é a atemporalidade de suas canções, sobretudo, daquelas relacionadas à Vanguarda e críticas à Ditadura Militar. É o caso de “Roda Viva”, com a qual chegou ao terceiro lugar no Festival de Música Popular Brasileira, em 1967, e que também inspirou o nome do famoso programa da TV Cultura. “Apesar de Você” e “Vai Passar” também se encaixam na descrição em questão. Não por acaso, sofreram os efeitos da censura vigente, que não tolerava qualquer coisa que tivesse um tom “subversivo”.
Versátil, transita livremente entre o samba, a bossa nova e qualquer outro gênero musical; além de abordar os mais diversos temas em suas composições. Por isso, em 1994, quando de seu aniversário de 50 anos, a Polygram Phillips lançou uma coletânea de cinco volumes, cujos títulos eram “O Político”, “O Trovador”, “O Amante”, “O Cronista” e “O Malandro”. Todas essas facetas são encontradas naquilo que criou.
O Chico político é aquele de “Cálice” (parceria com Gilberto Gil na composição e com Milton Nascimento na interpretação), “Construção” e “Gota d’Água” (parceria com Paulo Pontes, que Bibi Ferreira imortalizou no espetáculo homônimo), por exemplo. O Chico trovador é o mesmo de “Valsinha”, “João e Maria” (parceria com Sivuca, que havia composto a melodia nos anos 40) e “As Vitrines”. O Chico amante nos deu “Atrás da Porta” (parceria com Francis Hime, que Elis Regina imortalizou), “Olhos nos Olhos” (que recebeu interpretação irretocável de Maria Bethânia) e “Bastidores” (que se tornou uma das marcas registradas de Cauby Peixoto). O Chico cronista produziu “Bye, Bye Brasil”, Geni e o Zepelin” e “Gente Humilde” (parceria com Vinícius de Moraes, que encontra em Angela Maria a sua melhor intérprete). E finalmente, o Chico malandro nos presenteou com “Quem te viu, quem te vê?”, “Até o Fim” e “Vai trabalhar, vagabundo”.
Como se não bastasse ser um expoente do cancioneiro brasileiro, também destaca-se na dramaturgia e na literatura, tendo sido reconhecido com o Prêmio Jabuti, além de condecorado com a Ordem do Mérito Cultural (OMC). Soma-se a isso o seu engajamento na luta democrática e militância política, nas manifestações pelas Diretas Já e em apoio às candidaturas de Lula, Dilma Rousseff e Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores. Nem mesmo o exílio para a Itália nos anos de chumbo o desestabilizaram.
Nas palavras do amigo e parceiro Caetano Veloso, “O Brasil é capaz de produzir um Chico Buarque: todas as nossas fantasias de autodesqualificação se anulam. Seu talento, seu rigor, sua elegância, sua discrição são tesouro nosso”. Pessoas como Chico eternizam-se em vida, por toda a contribuição que delegam à humanidade. Ele é parte da história viva do Brasil, mas é “Paratodos”, já que é cidadão do mundo. Ninguém sabe como ele retratar as “Carolinas” da vida. Tampouco, a esperança de que “apesar de você, amanhã há de ser outro dia”. A determinação de afirmar que “a gente vai contra a corrente, até não poder desistir”, recusando o “cálice” de “vinho tinto de sangue”. Muito menos os “olhos nos olhos” dos desencontros amorosos. Chico é muito mais que alguém a ser ouvido. É para ser sentido, apreciado. No dia do seu aniversário, quem ganha o presente somos nós, por podermos desfrutar da sua existência.
Texto por Davi Vieira
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